20 junho 2008

Com um garfo numa terra de sopas

Ela estava triste. E tristes estavam os seus olhos. Aquela tristeza sublime que sucumbe e desarma numa vã tentativa de se soltar. Esses olhos outrora demonstrando alegria, simpatia, diversão. Esses mesmos olhos outrora alegres, agora só transmitindo tristeza, dor, saudade do passado e até do futuro. Saudade do futuro.

Olhos que se perdem no horizonte da memória. Olhar perdido. Olhar vazio.

E sem que ninguém desse conta a sua memória trabalha, e as imagens de um passado recente correm numa sucessão louca.

Slides de memórias.

Slides de imagens.

Imagens de um passado.

Passado recente.

E é nessa sucessão louca de imagens que, sem querer, ela congela uma imagem.

ELE.

Surge um fugaz sorriso, um olhar terno. E terna é a lembrança. Lembrança daquela noite. Uma noite curta. Uma noite cujos corpos se fundiram num só. Cujo olhar ficou preso um no outro como um iman, desejando reter a imagem do seu olhar pra sempre.

E essas imagens valem mais do que mil palavras.

E o efeito dessas imagens, dessa lembrança é devastador e aterrorizador. Sem querer o seu olhar brilha, o seu corpo estremece, os lábios humedecem, os olhos escurecem, os quadris arqueiam-se e o sexo lateja.

Molhada. Exitada.

Desejo. Ternura.

Paixão. Amor...?

"Besteira!" Ela assim pensa. Mas bem no fundo ela sabe que não é bem assim. Se assim fosse ela jamais perderia noites de sono e sonho. Sonhando acordada. Sonhando com algo e alguém impossível. Tecendo mil e uma fantasias.

Caso fosse uma simples besteira, ela jamais perderia o seu tempo vendo esse ele durmindo do seu lado, jamais perderia o seu tempo perdendo-se nesse olhar escuro, jamais perderia o seu tempo ficando calada enquanto o ouvia discorrendo sobre assuntos mais variados.

E mesmo tentando convencer-se de que ele era só mais um, a "célula revolucionária" (in Die Fetten Jahre sind vorbei, Os Edukatores de: Hans Weingartner) chamada coração, não deixa, pois ela insiste em bater forte quando mencionado o nome dele e continua batendo forte na sua presença.

Numa espera eterna em que um dia, quem sabe, ela seja tomada pela mão e levada pelo mundo. Que lhe seja mostrada uma gota de orvalho e que ela veja um diamante.

Rodeada de gente, ela se sente só, perdida.


Ela é uma mulher com um garfo numa terra de sopas.

1 comentário:

Anónimo disse...

Senti-me menos sozinha quando acabei de ler...
Tenha certeza de que serei leitora assídua do seu blog!
Te adoro muito, minha flor...
E não deixe de escrever, por favor.

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